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A teimosia, a burrice e coisas afins
Olá Querido Amigo,
      Fico me perguntando o quanto ainda você vai me dar coisas a pensar...E um dos motivos de minha carta para você hoje é para pensar sobre o que conversamos há dias atrás...sobre a "burrice", a "teimosia" e coisas afins. Sei que discordamos quanto ao significado dessas palavras e que você afirma que troco seis por meia dúzia...Pois bem, fiquei pensando em seus exemplos que sempre implicam em situações humanas de difícil manejo: a mulher que se sujeita a ficar em um relacionamento com um homem que não vale nada, que a abandona, que volta, que a engravida por uma, duas vezes e que novamente vai embora...e com o qual ela persiste em ainda manter-se atada de uma forma, no seu modo de ver - "burra" de se relacionar. Embora avisada, orientada, ela recursivamente volta ao mesmo e vivencia o mesmo abandono e negligência de alguém, que igualmente se comporta como um animal instintivo à procura do prazer.
       Nessa minha procura, descobri que de um ponto de vista conceitual ao pobre do "Burro" é atribuído um adjetivo de pouco inteligente. São fortes, pequenos, mais limitados intelectualmente...Entretanto, você sabia que quando há perigo na estrada o "burro" empaca e não vai nem para a frente e nem para trás? Quando o caminho é muito difícil e envolverá um risco muito grande ele não segue viagem. Provavelmente o garboso Cavalo iria em frente sob o comando do dono, mas o Burro não. A história, a mitologia, as fábulas popularizaram o Burro como sinônimo da pouca inteligência. Mas somos seres humanos, com potencial genético para desenvolver habilidades intelectuais as mais diversas e por que nos comportamos de forma pouco inteligente quanto no exemplo que me deste? Persistir em situações e relacionamentos equivocados, não aprender com os erros é simplesmente falta de inteligência? Quantos intelectualmente bem posicionados, sabidamente abonados pela vida em várias dimensões persistem em relacionamentos recursivos, emocionalmente pobres e sem futuro? Quantos são infelizes, se sabem presos a condutas, a parceiros que os desqualificam, que os destratam e não tem coragem de mudar? Será uma ausência de inteligência ou de uma teimosia insana? Eis o que você me deu a pensar em pleno domingo de sol entre nuvens e de uma noite quase insone...
       Enfim, mantenho a minha posição de que há mais coisas do que uma ausência de inteligência nessas condições. E de que necessariamente não se trata apenas de uma conduta tola...Aprendi também, nessa minha procura de que habitualmente tais condutas, denominadas de burras, tem um "quê" de inconscientes...no sentido de que não chegam a se dar conta das tolices em um plano consciente, racional...E também, cheguei a conclusão de que é uma ofensa aos animais "Burros"...porque eles pressentem o perigo e não seguem e o ser humano continua e continua em uma eterna repetição. Talvez devêssemos utilizar outra palavra para substituir o "adjetivo burro"... Suspeito que seja mais do que essa definição encerra, pois para mim, tais condutas equivocadas e recursivas em si mesmas, trazem consigo aquilo que lhe disse: um ganho secundário. Lembro-me de um amigo que mal dizia a namorada, com quem estava há anos...Não via nela atributos e nem qualidades, queixava-se disso e daquilo, se sentia preso, pressionado...mas continuava namorando com a moça. Daí perguntei-lhe o que o mantinha no relacionamento. Ele parou, pensou e não soube responder...disse apenas que era bom ter alguém...Aí quem parou fui eu. Ter alguém para quê? Foi quando me dei conta de que, embora ele não a apreciasse em várias dimensões, pelo menos era isso que ele externava...havia uma compensação: "ele tinha alguém com quem podia "dormir", abraçar, beijar e satisfazer seus desejos...alguém que provavelmente lhe dava uma "segurança" fictícia pois estaria ali, disponível...enquanto o que ele chamava de amor da vida dele o tinha abandonado. Então, havia um ganho no comodismo da situação. Ela era, supostamente para ele, um terreno dominado, não o abandonaria e o satisfaria sempre que possível e desejável...Ruim? Também acho, muito ruim...O bom foi perceber no rosto dele o espanto quando lhe perguntei qual o ganho secundário que ela trazia para ele...Meses depois soube que ele havia rompido o namoro.
        Enfim, reforço de que, mesmo sabendo dos erros em que estamos mergulhados há uma zona de conforto que nem sempre é bom mexer. Para que revirar histórias e mexer em situações que vão nos exigir mudanças? E principalmente, que vão exigir novas condutas, outros padrões de comportamento para o qual nem sempre estamos preparados? Por que buscar, na encruzilhada da vida, caminhos desconhecidos cujos rumos nem sequer sabemos onde vai dar, quando o que estamos, mesmo difíceis são conhecidos, dominados? Ainda confirmo, não se trata apenas de falta de inteligência o que chamam de uma burrice contumaz. É uma dificuldade interior para perceber a si mesmo, para olhar o próprio reflexo no espelho da vida, para respeitar a si mesmo como no exemplo que me deste. É uma cegueira de olhos abertos e que não permite valorizar as qualidades que há em si...é nivelar a si mesmo por baixo, pela menor escala, quando nascemos para sermos mais e melhores do que somos..
       Acredito que um dia, os véus da obscuridade caem...Sei que até que isso aconteça muito sofreremos e faremos sofrer. E que muitos persistem em condutas equivocadas porque ninguém lhes disse nada, outros muito ouviram mas não internalizaram o conteúdo do que foi dito, menosprezaram avisos, conselhos, conhecimentos e hoje colhem o fruto do que plantaram...E se há uma expressão que gosto em você é quando diz "que colhemos o que plantamos". Os antigos tinham um ditado: "quem planta vento, colhe tempestades"...Pois é, volto a minha analogia com o "semeador"...Com certeza, erraremos de um ou do outro jeito...Somos seres humanos e, como tais, tempos potencialidades infinitas e erros grosseiros, mesmo sendo pós graduados nas maiores e melhores universidades. Nem sempre os diplomas pendurados na parede nos fornecem guarida ou nos habilita a não cometermos os inevitáveis erros a que estamos sujeitos. Contudo, cedo ou tarde, algo grita dentro de nós...e aí nos veremos na encruzilhada da vida, tendo que novamente escolher um outro caminho...e uma pergunta fica: para onde iremos? Que caminho escolheremos? Terá menos risco que o anterior? Seremos mais felizes?
       Querido Amigo, não tenho respostas para nenhuma dessas perguntas, exceto a certeza de que movimentar-se, tomar uma atitude diferente, pensar diferente do que vínhamos fazendo e mexer no aparente dado e dominado, transformando a si e ao outro, já será uma grande vitória na reconquista de si mesmo. E reconquistar o domínio sobre si, exercitando o livre arbítrio com a consciência do nosso potencial em aprender e progredir, indo adiante, já será uma grande conquista. E se isso vai nos trazer felicidade ou não, só o tempo pode dizer. E para encerrar esta nossa conversa, digo-lhe que ficar remoendo o que passou, os erros que se cometeu, o quanto se foi "burro", nada acrescenta. Aprender com o erros, para mim, não é ficar remoendo e ruminando os erros que se cometeu...é simplesmente assumir e fazer as mudanças que se fizerem necessárias. Uma palavra dita, uma ação depois de praticada não há como retroceder...o importante é sabermos qual lição fica e com ela irmos adiante...
        Querido Amigo, ainda desejo que a curiosidade que percebo em seu olhar, seja para sempre buscar aprender cada dia mais as lições que a vida ensina. Não é à toa que viemos a este mundo: há muito a aprender...e quem sabe a ensinar...
        Um grande e saudoso abraço de quem se importa e valoriza a sua existência...
Com amor...
Ana Izabel JS
Enviado por Ana Izabel JS em 16/02/2014
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