Sonhei com você...
Olá Querido Amigo,
É sempre necessário começar perguntando: como estás? Às vezes não me acho polida o suficiente para os ditames da etiqueta. Às vezes chego, digo o que quero e me esqueço das formalidades iniciais, dos cumprimentos necessários para iniciar uma conversação...Contudo, gostaria de esclarecer que esses desacertos somente acontecem com quem tenho uma enorme familiaridade e uma intimidade extrema. Com os desconhecidos ou parcialmente conhecidos, as regras da etiqueta funcionam muito bem...porque junto a estes sou tímida, conservadora e sei, muitas vezes, distante...
O domingo começa e na verdade não tinha a intenção de escrever...Entretanto, sua imagem esteve presente em meus sonhos ao adormecer e acabou tornando-se inevitável escrever para você. É, agora estás mais distante do que antes, e nem ao certo sei em que lugar deste mundo habitas. Em meus sonhos você estava próximo, muito próximo, me aconchegando em seus braços e sorríamos muito, por tudo e por nada. Estávamos felizes, mas também conversávamos sério...seus olhos escuros queriam vasculhar a minha alma e foi com esta imagem que acordei para a manhã de sol que hoje faz.
Ontem a sua imagem também invadiu o meu dia com insistência. Rezei por você, te desejei paz, alegrias...mesmo assim hora e meia você voltava ao pensamento...Daí fico a questionar-me sobre esta bizarra sintonia: é eu que penso ou pensamos juntos e aí nos sintonizamos? O que isto significa? Ah, como eu queria ter certas certezas...mas já aprendi que no mundo em que vivemos isto é impossível. Seja como for, isso acontece e o jeito é pensar que tais lembranças ou sensações são como o vento, a chuva...vem e vão e se modificam com o passar das horas. Então, hoje faz sol e a sua lembrança ilumina meu dia, o sabor dos abraços e beijos, da cumplicidade do sonho serão meus companheiros durante a manhã e quem sabe, a noite, terão desaparecido...Ou talvez, ao anoitecer, voltemos a nos encontrar nos sonhos e alimentar em nossa alma esta curiosa sintonia...
Aproveito para dizer-lhe que há dias atrás eu estava vazia como um pote sem água...Meus olhos estavam acinzentados por uma constatação inevitável. Você poderá perguntar-me: que constatação? A constatação que vim ao mundo sozinha e a de que viverei, os dias que me restam, aquecida apenas pelas doces lembranças de sua presença, tendo que conviver com a sua eterna ausência física. Com certeza você me dirá: todos viemos sozinhos a este mundo!
Sei...Compreendo isso, viemos sozinhos e aqui encontramos alguém com quem partilhar uma vida...Alguém para dividir os sonhos que gravitam na alma, para dividir dúvidas, dívidas...como diria um outro amigo meu. Só que, às vezes, com minha imaginação divagante penso que não é bem assim...Em outros momentos já lhe falei sobre encontros, em outros sobre desencontros, e agora te pergunto: qual a mágica que faz com que duas pessoas desconhecidas se encontrem, se interessem uma pela outra e daí sigam uma vida inteira juntas? Aqui, não me refiro a "casamento" e qualquer formalidade que o mundo propõe. Falo de sintonia, de parceria, de cumplicidade. Falo na lógica daquela definição de amor que um dia me deste: daquele passo a passo na caminhada juntos, das peripécias que um e outro fizeram, mas que são cúmplices, daqueles detalhes de uma vida com o outro, que parecem banais mas são significativos: o tom da voz, o jeito de sorrir, a forma como se irrita, as caretas que faz, os gostos e desgostos e de como isso preenche a alma um do outro, as rugas que aparecem e nelas o resultado de uma história...a história dos dois. Lembro-me que me emocionei com sua definição, me apaixonei por ela e fiquei durante muito tempo gravando-a em meu espírito para não esquecê-la...e acho que foi assim que não esqueci de você.
E é a partir daquilo que você me disse: que, não só vim a essa Terra sozinha, como sozinha permanecerei. Não me julgue pessimista por isso ou mesmo entristecida. Confesso a você: tenho outras compensações...Tenho outros motivos para sorrir, outras pessoas para abraçar, outros afazeres que utilizam um mecanismo chamado: sublimação. Você já deve ter ouvido falar sobre isso. Sem entrar nos meandros de uma definição psicanalítica, prefiro a que apenas define sublimar como "engrandecer um sentimento, exaltar, purificar"...Parece maluco, mas também significa dar um outro sentido e canalizar para outro foco determinados sentimentos...Com certeza você irá sorrir e novamente afirmar que com isso estou fugindo...Repito que não, mas essa é uma forma um pouco mais saudável do que ficar remoendo vicissitudes, incompletudes e qualquer tristeza recorrente...Eu, pelo menos tenho lembranças...as suas lembranças...Acredito que ter lembranças, não se arrepender pelo que se fez e mais do que isso, ter tido a coragem para fazê-lo é o que me consola. Isto significa que pelo menos eu tentei, não deixei passar uma oportunidade sequer...
Na verdade, isto é uma conquista feita após uma perda. Nesta caminhada, houve alguém a quem eu nada disse e permite que saísse da minha vida sem uma palavra minha. Eu, na ingenuidade da vida que começa, não pensava na transitoriedade do tempo, nas mudanças de cidade, de Estado a que estamos sujeitos na infância. Na onipotência deste período, acreditei que teria todo o tempo do mundo...Eu vivia na lógica de que "amanhã eu resolvo, amanhã eu falo"... Mas o amanhã para os dois não mais existiu...Ele se perdeu na multidão e eu fui levada para muito longe do lugar onde nos conhecemos...Eu não aceitei o pedido de desculpas que um dia ele fez...e o deixei partir, como se ele nada representasse na minha vida...Na minha impulsividade juvenil deixei de dizer o quanto o amava e que, com certeza, o ato de ele desculpar-se pelo que havia feito, representava para mim um cuidado importante. Ensaiei mil desculpas na frente do espelho, mas a timidez foi maior, o medo foi gigantesco de que ele igualmente não me desculpasse...e o tempo passou...e a vida mudou e nos separou...e nós nunca mais nos vimos... Mas as lembranças daquele amor de criança e das lições nele apreendidas, continuam guiando meus passos e não me permitem mais, brincar com o coração das pessoas e nem mesmo menosprezar sentimentos... E quanto a ele? Não sei...Sequer imagino se ainda lembra da garota voluntariosa e geniosa que um dia conheceu...Ignoramos por completo o paradeiro um do outro e no embaralhar das cartas do destino, sinceramente não acredito em um reencontro. Talvez, assim como você, ele tenha vindo ensinar-me uma lição...que acredito eu tenha aprendido muito bem.
Então, meu amigo por hoje é isso...Há uma infinidade de coisas a fazer no dia de hoje...e não fique preocupado, tudo passa...O que para mim, permanece eterno é o que sentimos de real e verdadeiro...e isto, é o meu amor por você.
Fique bem!!!
Ana Izabel JS
Enviado por Ana Izabel JS em 09/02/2014
Alterado em 18/02/2014