Textos

Chuvas de Verão
   A chuva passou. Os trovões terminaram por ecoar ao longe e as razões da eternidade perderam-se atrás das montanhas...mas, momentos antes, o céu havia adquirido uma coloração escura com a tempestade que estava prestes a cair desabando sob corações acalorados do verão rigoroso. Aqui e acolá, ruídos, anúncios de que em breve as nuvens trariam relâmpagos e trovões. Os ventos, forças supremas, lutavam em disputa pelas nuvens que, desorganizadas, ondulavam o céu. Nuvens que num instante seguiam como cabelos revoltos, num outro como um viajante errante, buscando os elos da existência.
    A chuva começara despejando uma cortina imensa de água entre a casa, o mar e as montanhas além. Os eucaliptos, submissos, deixavam-se levar pelos ventos que disputavam caminhos. Suas folhas pequeninas, frágeis, dispersavam-se pela praia, o quintal e a imensidão. As amendoeiras das casas vizinhas, de forma resignada, iam e vinham com seus ramos nas direções do tempo. Frente à janela, a árvore, com seus brincos de ouro, balançava e pequeninas flores, de um puro amarelo derramavam-se ao céu na ventania infinda.
     Na casa escura, velas se acendiam, e a família se unia diante do medo de um e da curiosidade de outro. O elo entre as nuvens e as criaturas da casa tornava-se mais forte. Sendo assim, Noé voltava à tona, o concerto de Deus com os homens era lembrado. Histórias antigas, novas aventuras, pessoas obscurecidas pelo véu do passado ressurgiam em seus labores, suas atitudes engraçadas dos momentos que se fizeram.
    A escuridão recobria os cantos da sala e, no quarto, tremulava uma claridade pálida, nostálgica. A vela elevava sua pequena luminosidade aos santos Santa Bárbara, São Jerônimo na tentativa de acalmar a fúria dos ventos e trovões. Dádiva oferecida aos cultos de ontem relembrado no desespero e temor do momento. Lá em cima, com mãos invisíveis ocorria o encaminhar das nuvens, a direção dos raios e Deus, a observar o panorama, nos domínios do universo movimentava as potências da natureza.
     Aos poucos, o barulho do trovejar diminuiu. Janelas foram abertas, corações aliviados respiravam o cheiro da terra e percebiam o pássaro, o barco, que solitários permaneciam no mar. As gotículas reunidas no céu, impressionaram os olhos, dando esperança ao espírito com seu arco-íris de cores vivas cruzando o céu em um abraço.
     A luminosidade fez-se presente nas lâmpadas de diversos volts que se acenderam nas partes da casa, das ruas e praças. Talvez, como naquela casa, outras podem ter tido suas famílias assim reunidas, lembrando histórias e contos de suas vivências. Juntas num mesmo recôndito assombro diante da natureza. Contudo, nem sempre há nuvens, chuvas ou trovões para unir, recordar, expressar um jeito de viver.
     A chuva passou, a luz voltou e as pessoas...As pessoas calaram seus lábios, desfizeram os laços, seguiram seus caminhos, fechando atrás de si a porta de seus quartos. Aí, a sala ficou entregue ao barulho da televisão, trazendo as imagens de vidas distantes e da desunião que o mundo abriga.

Ana Izabel JS
Enviado por Ana Izabel JS em 14/12/2013
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